sábado, 8 de novembro de 2008

Entrevista ao Balaio Virtual

Teatro do Ofício: dramaturgia paraense

Cada integrante do grupo traz consigo a experiência dos ofícios exercidos em suas trajetórias artísticas e se propõe a um revezamento de funções. É esta a tônica do grupo teatral fundado por Stéfano Paixão, Luiz Fernando Vaz, Carlos Henrique, Leonardo Cardoso, Kleber Farias, Marcelo Andrade e Gisele Guedes.

E é daí que surge o nome Grupo Teatro do Ofício, que está encenando a peça 'Uma Flor para Linda Flora', durante este mês no Museu Emílio Goeldi, em Belém. Nesta semana, o Portal ORM conversou com os integrantes do grupo que falam da temática da peça, da paixão pelo teatro e das experiências na dramaturgia. Acompanhe a entrevista!

Portal ORM - O Grupo Teatro do Ofício estréia com Uma Flor para Linda Flora, de Carlos Correia Santos. A peça foi contemplada pelo Edital de Fomento às Artes Cênicas (Prêmio Cláudio Barradas), promovido pela Secult e traz à cena um tema relativo ao meio ambiente. Como esse tema se desdobra no enredo de Uma Flor para Linda Flora?

Grupo Teatro do Ofício - Tulho, o protagonista, é um menino feito de lixo e entulho que acredita não servir mais pra nada e que ninguém dá importância. Até que aparece uma princesa chamada Linda Flora que acredita que pode haver um romance entre os dois. Mas com uma condição: que Tulho encontre a flor mais pura que existe.

Nessa jornada Tulho encontra-se com personagens que são afetados pela sujeira e pela poluição, com os quais aprende valiosíssimas lições sobre a poluição do ar e das águas, acerca da má educação dos que não jogam o lixo no lixo. Tudo isso com muita brincadeira e poesia. Vale ressaltar que quase 100% do material usado no espetáculo é reciclagem. Em suma, o espetáculo reciclou, recicla e quer reciclar ainda mais, não só lixo, mas também mentalidades.

Portal ORM - Como surgiu o grupo?

Grupo Teatro do Ofício - Surgiu no início desse ano. Tivemos o privilégio de ter trabalhado com diretores como Paulo Santana que, no Palha e na Usina de Teatro da Unama, sempre estimulou o exercício total da carpintaria e do fazer teatral. Juntou-se toda uma equipe de atores e técnicos versados em vários ofícios teatrais depois de um desmembramento destes grupos.

A palavra de ordem foi: vamos fazer, botar a mão na massa. Era isso ou viraríamos todos balconistas de farmácia. Mas o grupo, em verdade, surge é agora. Um grupo não se faz com uma reunião pra se bolar um nome, se faz em um processo diário de luta, sacrifício e entrega. Os que sobrevivem à gestação e ao dolorido parto se sentem como grupo e ponto final.

Portal ORM - Qual a importância de se formar um Grupo de Teatro com esse objetivo multifuncional que marca o Teatro do Ofício?

Grupo Teatro do Ofício - Daí o nome do grupo. O que almejamos valorizar neste grupo são os ofícios, os talentos. Nada de criação coletiva. Apesar de eu dirigir “Uma Flor para Linda Flora” como um diretor clássico - ansioso, verborrágico e meio maluco – sempre digo para todos: eu ser o diretor desta peça não significa que eu seja o dono do grupo. Estou exercendo uma função, não um cargo vitalício.

Portal ORM - Esse caráter multifuncional do Grupo não teria o propósito de desmitificar a profissão do ator, que é sempre idealizado como aquele que sempre está no palco, em cena?

Grupo Teatro do Ofício - Sim. O ator que sobe no palco só pra brilhar certamente sempre vai ter algo de seu figurino faltando na estréia. O que se nega aprender a iluminar, compor uma trilha ou martelar um prego deixa de perder uma bela oportunidade de se afeiçoar ainda mais ao seu espetáculo. Mas o ator estrela se acalma com elogios, eles são monstros sagrados mesmo. Acho que desmistificar o diretor e o produtor como donos dos grupos é ainda mais urgente. O ator que aprende a fazer de tudo tem mais chances de viver de teatro. Que digam os veteranos.

Portal ORM - Quais são as funções ou os ofícios envolvidos no teatro para os quais o Grupo forma seus participantes?

Grupo Teatro do Ofício - Não temos nada específico tal como cursos ou oficinas para os integrantes. Mas o processo desse espetáculo por si só tem instigado o potencial de todos para outros ofícios. Eu mesmo me surpreendi ao conceber uma trilha para o espetáculo. Outros descobriram que sabem costurar, enquanto uns já ensaiam escrever peças inéditas e experimentam manipulação de bonecos.

Portal ORM - O Teatro do Ofício tem propósito de promover cursos ou oficinas de teatro para quem pretenda iniciar-se na carreira de ator e outros ofícios de teatro? Quais os projetos e perspectivas de execução?

Grupo Teatro do Ofício - Estamos amadurecendo uma parceria com a comunidade do bairro de Canudos, onde em breve começaremos a ministrar oficinas com o objetivo de descobrir novos profissionais dos palcos e dos bastidores. Ainda temos pela frente um processo de legalização, a busca de uma sede, de estrutura própria. Quanto a futuros trabalhos, vamos deixar que os textos nos escolham.

Portal ORM - Que avaliação o Grupo faz da realidade do teatro paraense?

Grupo Teatro do Ofício - A diversidade e a qualidade no teatro paraense é uma realidade. Mas bem que está mais do que na hora dos grupos sérios mostrarem a cara pra bater! Mais urgente do que correr atrás de dinheiro público é a necessidade de se criar lastro artístico para nossos trabalhos se expondo em festivais nacionais e à sabatina de críticos especializados. Os artistas paraenses reclamam que o paraense não gosta de teatro, mas também o público não consegue separar o joio do trigo.

Quem faz teatro com humildade nessa cidade paga o estrago feito pela picaretagem impune. Não há um só crítico de teatro em Belém. Um crítico apontaria ao público o que é consistente e um festival nacional como esse que acontece agora possibilita que se compare o que é feito lá e aqui e se dê a devida referência ao trabalho suado e honesto.

Portal ORM - Ter um projeto aprovado por uma lei de incentivo à cultura ajuda mesmo a conseguir patrocínio ou apoio?

Grupo Teatro do Ofício - Ajuda sim. Mas vai também do esforço da produção e da apresentação do seu projeto. Porém novamente quem trabalha sério sofre por causa da picaretagem e dos golpistas que usam o nome do teatro para outros fins queimando a classe com o empresariado. O patrocinador e o apoiador têm que ser mais respeitados. Não é fácil pagar uma das maiores cargas tributárias do mundo e ser mecenas nesse país.

Portal ORM - Qual a experiência que têm os membros do Teatro do Ofício em outras funções teatrais?

Grupo Teatro do Ofício - Stéfano Paixão além de ator tem experiência como diretor e produtor. Carlos Henrique e Kleber Farias tocam quase todos os instrumentos, da cenografia à maquiagem. Leonardo Cardoso além de atuar, dirige, produz e escreve peças. Marcelo Andrade e Gisele Guedes trabalham com arte-educação e estão pesquisando a manipulação de bonecos. Diego Rocha e Rony Prata são novatos, mas participam da confecção do cenário e dos adereços. Já eu estou empolgado com sonoplastia, produção e direção.

Portal ORM - O gênero dramático é um tipo de fazer literário que, além de divertir e encantar, também funciona eficazmente como recurso didático. De que modo a peça Uma Flor para Linda Flora pode ser tomada como recurso?

Grupo Teatro do Ofício - No reforço dos conteúdos relacionados à educação ambiental, à questão da poluição e do lixo e do cuidado com a natureza. Não tem cartilha nem cartolina, está tudo lá em forma, cor e poesia.

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